quinta-feira, 12 de maio de 2016

Viva a democracia!

Queridos amigos que compartilharam comigo sonhos e utopias nesse período que entrará para a história como o mais longo tempo com estabilidade democrática da história da república. Venho aqui fazer um breve inventário afetivo de um tempo lindo demais.
Estou puto e me sentindo traído sim. Começo falando disso, porque é disso o que menos vou falar aqui.
Já me deprimi, já me senti impotente, me assustei com as coisas que vi e ouvi nessa derrocada da democracia, nesse tempo obscuro e deprimente onde as trevas prepararam o terreno, onde gente querida serviu de massa de manobra.
Mas, em tempo de despedida, lembro com carinho e apego à beleza poética de um tempo democrático, onde pudemos sentir a força política da liberdade, do amor, da esperança. Até mesmo por contraposição à tamanha vileza e covardia de traidores sendo, no mínimo tolerados,e  na exacerbação, tratados como heróis.
Tive o privilégio de completar 14 anos de idade quado a ditadura militar deixava de ser a instituição oficial, e a inauguração da nova república;
tinha 18 anos de idade quando a constituição da república foi promulgada.
Vivi um tempo lindo, de esperança e de amor.
Encerro me dirigindo ás minhas filhas.
Amanhã, avisarei que fomos derrotados.Mas nunca desviarei os olhos dos seus olhos, porque devotei minha vida pela liberdade, pelo amor, pela esperança.
Nunca tememos a luta, o enfrentamento desigual e covarde. Nascemos e nos construímos nesse enfrentamento.
Por isso, me despeço de um tempo histórico carregado de beleza, fazendo dessa beleza toda a força que teremos no enfrentamento e na coragem que nos será exigida adiante.
No momento, os covardes e os traidores triunfam. Mas no curso da vida, nosso amor e esperança será maior que tudo isso.

sábado, 6 de junho de 2015

Despedida de B.B. King

Eu era apenas um sweet eighteen, Tinha acabado de completar 18 anos, coisa de três meses atrás. Me sentia um homenzinho, como os meninos de dezoito sentem, e com razão. Já tinha carteira de motorista e já conhecia o amor e seus demônios. Tinha recém conhecido o blues verdadeiramente negro através do álbum "Takin' care of business de Freddie King , e me apaixonara. Pelo álbum, pelo blues, pela vida, por uma mulher. Enfim, o blues havia chegado em minha vida.
B.B. King vinha tocar no Olimpia, em São Paulo. Meu pai Dorival da Silva, generoso como sempre me emprestou seu fusca, na época um baita carrão, e fomos eu, Reinaldo Nunes Marcão Caverna e Ball (que time, zizuis!) ao show.
Ali eu vi um homem, um perfeito cavalheiro, um ser generoso subir ao palco e se desnudar como artista. Vi que a coisa toda podia ser verdadeira, humana, catártica e cotidiana ao mesmo tempo. Ali vi uma celebração da música, do amor à vida, à beleza, à amizade, à gentileza.
Ali, com dezoito anos de idade, decidi o que queria fazer da minha vida: Queria tocar blues, tocar guitarra. Mas, acima de tudo, ali tive uma aula definitiva de gentileza, generosidade, elegância sem afetação, beleza, tesão. Tento até hoje seguir esses ensinamentos. B.B. King não foi só um músico. foi um filósofo simples, das plantations de algodão, um homem que só conheceu o pai depois da fama, e que, quando sua mãe morreu, ele com apenas oito anos de idade, ficou morando e vivendo sozinho em uma cabana no meio da plantação de algodão. E que saiu de lá para Memphis, para o mundo para a história. Obrigado, meu rei, o único rei que eu reverenciaria, mesmo você não gostando de reverências. Obrigado mesmo, do fundo do meu coração, hoje estilhaçado,

Histórias da vida real - Morte de B.B. King

Confesso que fiquei mudo com a morte de B.B. King. Sei que a morte é parte da vida, ele tinha 89 anos de idade e já estava bastante debilitado. Mas quando aconteceu, fiquei meio sem palavras. estava de madrugada em um butecão com alguns amigos quando a notícia chegou.
meu amigo e parceiro Bruno Burns estava comigo nessa hora. Transcrevo aqui o texto dele registrando esse momento:

"Da série: SÓ LEIA SE ACREDITAR no BLUES. Obrigado. Com Marcos Boi.
- Histórias da vida real (15 de maio de 2015) Morte de BB King, com Marcosboi Blues
Já era quase dia e, após uma madruga de sons, papos e algumas doses moderadas de álcool, estava com meu amigo e bluesman Marcos Boi em um famoso boteco copo sujo da cidade de Sorocaba, comendo porcarias e celebrando nossa amizade. A noite era fria e, de certa forma, muito alegre, todavia, uma fatídica notícia mudaria o clima do ambiente (pelo menos aos nossos olhos). Marcos Boi recebeu uma mensagem em seu celular asseverando: BB King havia falecido. Imediatamente o clima descontraído começa a ficar nebuloso.
Ora, por mais que a idade avançada de King e seu estado frágil de saúde, anunciassem que sua partida deste plano seria breve, a incredulidade reinava. E como poderia ser diferente, não é ??
O mito BB King, o qual tive o prazer de cumprimentar pessoalmente e prestar a devida homenagem ainda em vida, era o ídolo de muitas gerações, um inventor do Blues , um encantador de sonhos, um mágico da guitarra e, até pouco antes de sua partida, mantinha-se ativo, nos palcos do mundo. E claro, como não podia deixar de ser, ídolo máximo de Marcos, e meu também.
Boi manteve-se inicialmente calado, tentando digerir o que acabava de me contar, porém, nitidamente se apresentava agitado, procurando não comentar muito, somente questionava em voz alta: "Será que é verdade??
Bem, pensei comigo, pela boa índole do informante e tudo que o noticiário vinha relatando há tempos, era pouco provável que se tratasse de uma brincadeira ou, quiçá, um engano.
Fiquei calado e pensativo, resgatando os momentos que estive na presença do ilustre octogenário rei do blues. relembrei como sua guitarra soava bem, cada nota valia mil, seu bom gosto era imensurável, seu carisma diante dos súditos e sua infinita humildade. Era um ser humano iluminado, sem qualquer sombra de dúvidas.
Bem, não demorou e a televisão do malfadado estabelecimento anunciava: "BB King, o Rei do Blues havia falecido".
Em seguida, faltaram palavras. Após, um hiato de silêncio, Marcos Boi, ainda não acreditando, novamente questiona: "Será que ele morreu mesmo?". Ainda permaneci em silêncio, porém, de pronto Boi confessou:
"Estive há anos estudando como lidaria com a morte de um ídolo tão importante como BB, e mesmo assim, não sei como lidar com isso neste momento, após saber do ocorrido".
E ainda continuou seu desabafo, na minha humilde opinião de maneira a ser parabenizada, denotando o grande ser humano que é, que sente os dilemas da vida, que possui sentimentos que transcreve em sua guitarra, motivo pelo qual é o grande músico que é, pois toca com a alma:
"Pode parecer piegas, exagerado ou brega, mas meu camarada Burns, eu realmente acreditava em toda lição do velho mestre King, sua obra mudou minha vida, lapidou meu caráter e deu rumo a minha paixão, que é viver de música, nos palcos, tocando com muito amor e respeito".
Em seguida, humildemente, Marcos Boi, questiona-me:
"Meu irmãozinho Burns, meu amigo camarada, como foi lidar com essa perda tão grande?
Respondi imediatamente, sem piscar, segurando a mãos de Boi:
"Tocando um blues".
Nos abraçamos e um suor hetero escorreu de nossos olhos.
Um viva ao eterno BB KING."

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Piano de Tom Jobim

          Estava ouvindo o magistral álbum Edu & Tom, de 1.981, uma antológica parceria de Tom Jobim e Edu Lobo, mais precisamente a canção “é preciso dizer adeus” , e pensei em encontrar uma imagem que representasse como vejo e sinto o piano do Tom, sem idealizar, buscando aleatoriamente, na base do insight, e a imagem que me veio foi esta:
Imagine que você tem uma mulher que ama, e vocês estão bem. Ela é companheira, parceira, com aquela cumplicidade que só os verdadeiros casais podem ter. Daquelas que o tempo passa, a intimidade aumenta e o seu desejo nunca arrefece.
         Pois bem, vocês saem uma noite. Comem uma comida muito boa, e você observa o brilho nos olhos dela. Vão para um barzinho, encontram amigos queridos, bebem um pouco, dançam um pouco, conversam muito, riem muito. Aí vão pra casa, pra cama. Fazem amor de um jeito tranquilo e caudaloso, relaxado e incendiário. Dormem cansados.
No dia seguinte, você acorda um pouco antes dela, na claridade suave do quarto pela manhã. Está deitado com o rosto há um palmo do dela. Ela ainda dorme. Você observa a expressão relaxada, a beleza dos contornos, sente o cheiro sutil dos seus cabelos.
        Então ela acorda. Abre os olhos, e eles trombam imediatamente com os seus, como se mergulhassem despretensiosamente um no outro. Então sorri um sorriso sutil, apenas de canto de boca. Mas um sorriso que vem lá do fundo da alma, de tal maneira que seu rosto se ilumina.

         Isso pra mim é piano de Tom Jobim.

sexta-feira, 7 de março de 2014

Labirintos blues

Quando tocar o blues, lembre-se: vc não deve correr atrás do blues, persegui-lo. Vc deve flertar com o assédio dele, e torcer para sair vivo no final. O blues é algo que te atropela.

https://soundcloud.com/marcosboi-blues/labirintos-blues

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Aniversário de Jimmy Hendrix

A dimensão humana junto ao poder de síntese da arte é o que sempre me apaixonou. O poder de ser extremamente íntimo e solitário na sua criação, mas tocar a intimidade de toda uma multidão, cada um com suas diferenças. Porém, quando imagino Johann Sebastian Bach criando todas aquelas polifonias em sua distante época e ainda tão profundo e atual; quando pela primeira vez parei em frente ao original "Rosa e azul" de Renoir e ví toda aquela luz, aquela força de expressão (as reproduções fazem parecer um quadro prosaico, mas, estar frente a frente com o original da obra é uma coisa inebriante) penso que alguns caras tem algo além do que a maioria dos simples mortais, e não estou falando de religiosidade não. É pensando nisso que quero deixar minha homenagem ao aniversário de um cara que também fez na arte algo que pra mim vai além do que nós mortais poderíamos fazer. Hoje um senhor, James Marshall Hendrix completa mais um ano de vida. E ele era um guitarrista! um bluesman psicodélico, um grande compositor e arranjador, uma mente livre, uma alma inflamada. E, tocando guitarra... ah, meu deus! o que era aquilo! Obrigado, mestre. Você foi insuperável!


quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Violinos, barracas de camping e grandes olhos

Há vinte anos atrás entrei no berçário do Hospital Samaritano em Sorocaba, e todas as crianças estavam dormindo, embora fosse em torno do meio-dia. Menos uma, que estava com seus olhões arregalados. Eu já era um menino aos 23 anos, mas confesso que ainda tinha muito que aprender, muito que viver para me tornar o menino que hoje sou. Esse bebê continua com olhos enormes como os meus. Mas cresceu, ficou do meu tamanho, e me cresceu junto. Há vinte anos atrás, minha Gabi Silva estreiava neste mundo louco e belo. O amor renascia pra mim. Quando pela primeira vez a peguei em meus braços e senti seu cheiro, não fazia idéia de quanto minha vida mudaria, e para melhor. Nesses vinte anos, brincamos, cultivamos nossos silêncios, dividimos nossa barraca de camping, estudamos violino juntos, trocamos livros e filmes, fomos mais do que pai e filha, amigos. Lembro que quando gravei o CD "Diversônico" da banda Deciberros, de uma certa maneira até hoje inédito, apesar de ter tocado bastante em rádio, era uma época em que eu ficava o dia todo com Gabi, ela com mais ou menos seis pra sete anos. Passava horas no estúdio, vivenciando aquela experiência incrível que era gravar meu primeiro CD realmente com músicas autorais, cuidar dos arranjos, dos timbres. Não tinha com quem deixar Gabi, e a levava com uma sacola de brinquedos para o estúdio. Enquanto eu gravava as guitarras, ela me esperava brincando. Em uma certa ocasião, resolvemos gravar um simples "ahã" com uma voz feminina na música "malandra". Tom Soares, o vocalista da banda e autor da música sugeriu que Gabi gravasse. Ela não quis nem papo. Ali vivenciei uma das belas características de Gabi: Ela é fácil de lidar, não reclama muito e topa qualquer aventura. Mas quando ela diz NÃO, quer simplesmente dizer não. Insistir é perda de tempo. Minha guria sabe o que quer e o que não quer. Me orgulho disso. Hoje sinto o coração repleto e as lágrimas felizes no rosto, por ter esse amor tão vivo, e vê-la seguindo sua vida, prestes à experimentar a emoção que vivi naquele dia 13 de agosto de 1.993. A caminhada teve suas pedras, nem sempre foi fácil, mas juntos, nunca fomos de cultivar a facilidade. Estamos grandes e fortes, cultivando esse amor que se multiplica. Parabéns, minha filha querida, e, com licença, também me dou parabéns por desfrutar de tamanha felicidade. Que venha a vida, ao lado de minhas filhas, é muito mais vida. Parabéns, Marlene Andrade , você merece mais que todos essa alegria. Bora comemorar, Gabi!